terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Pasolini, Moravia, Slumdog Millionaire, e um amigo na Índia

Soube que um amigo tinha decidido, este Fevereiro, gozar as suas férias na Índia. Conhecendo-o como conheço e mesmo sabendo que é curioso por descobrir novas coisas, duvidei que apreciasse, ou soubesse apreciar, a beleza da Índia para lá do Taj Mahal, das praias, ou dos circuitos turísticos para ocidentais com dinheiro. Nunca fui à Índia, mas suponho que se deve ir preparado para o que, aos olhos de um Europeu médio se apresente como, para usar um adjectivo suave, estranho. A sua abertura de espirito, dificilmente lhe permitiu encarar essa realidade sem sucessivos choques culturais. De resto, talvez um sentimento comum a quem lá vai pela primeira vez. Previ-lhe umas férias com o sobrolho constantemente franzido. Um tique seu que repete sempre que algo não lhe agrada.
Aquelas férias, precipitaram a vontade de começar a ler dois livros sobre uma viagem á Índia que Pier Paolo Pasolini e Alberto Moravia fizeram aquele país. Dos capítulos que li, Pasolini escreve sobre o quotidiano indiano numa perspectiva mais telúrica com descrições do modo de vida indiano e dos indianos — "O despertar de cada manhã deve ser um pesadelo. E contudo os indianos levantam-se, com o sol, resignados, e, resignados, começam a ocupar-se das suas coisas".
Morávia também, mas trás isso ao leitor numa abordagem metafísica pelo lado da religião e tudo o que ela representa na Índia — "A Índia não é um país com uma religião historicamente bem definida, com um fundador, uma evolução, um passado, um presente e um futuro. A Índia é o país da religião como situação existencial".
Foi tudo isto que me levou, sem grande expectativa, ao filme de Danny Boyle, embora uma frase numa entrevista sua me tenha deixado com a pulga atrás da orelha, no sentido em que achei que assim, tudo faria mais sentido, porque a aproximação teria um cunho mais realista — "Desta vez, levámos umas dez pessoas e, no essencial, fizemos tudo com uma equipa de Bollywood. Não faz sentido encarar as coisas com o olhar ocidental, julgando que a cidade não funciona: de facto, funciona, mas não de acordo com os nossos padrões. É preciso saber utilizar isso. E foram 20 horas por dia...".
Estão neste magnífico filme, magnificamente bem filmado — com uma fantástica, bela, crua, triste e ao mesmo tempo, imponente fotografia — com um argumento delicioso, as Índias de Moravia e Pasolini (está tudo lá!! subliminarmente filmado) e provavelmente também aquela de que qualquer turista ocidental quer com certeza fugir, porque a terá observado de uma perspectiva europeia, de fora para dentro. O conceito de turismo, para viver a Índia — ou outro local qualquer do qual se queira entender o modo de vida — tem que ser reduzido ao mínimo para puder ser plenamente entendido. Mesmo que com ele não se concorde.
O filme, com todas as sequências, bem entroncadas umas nas outras, tem um final merecidamente feliz, a mesma felicidade que espero, tenha encontrado na sua viagem e de que de lá tenha trazido boas recordações, um novo conhecimento da condição humana e algo bem mais prosaico, como o caril. É que há um jantar combinado com a tribo que depende dessa maravilhosa especiaria. Tenha ele cumprido a sua parte do acordo.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Estás a ficar velho. Está, a ficar velho. Nunca o tratei por tu, não será aqui e agora. A sua educação beirã provinciana, nunca o permitiu. Hoje, já não me irrita e confesso que até acho piada à singularidade, nestes tempos em que, tu cá, tu lá. Sou dos poucos que conheço que tratam os iguais a si por você. Enfim, descontando os tios de Cascais, mas a nossa realidade é outra. Essa mesma educação que não permite o trato por tu, não permite a largueza de gestos. Um abraço, um braço por cima do ombro, um beijo a propósito de nada, apenas porque sim. Olho-o, e sinto que talvez quisesse e esperasse mais, mas também eu me habituei a ficar curto de gestos, tento recuperar essa faculdade, mas por vezes, não me sai natural. No fundo, sou "simplesmente o produto, do meio onde fui criado". Observo-o, e trinta e três anos depois de o conhecer, por vezes paro e olho-o, e vejo com certa melancolia, o homem em que se tornou. Vejo-lhe as rugas, os olhos empapados, e vem-me à cabeça, em retrospectiva, a sua cara bem mais novo, da minha memória de infância, da sua dinâmica para a luta da lida, da sua determinação para o trabalho, para os trabalhos, vários, ao mesmo tempo. Sei os porquês dessa angustia em que se tornou a sua vida, das preocupações, da tristeza, da revolta, mas não compreendo e custa-me a aceitar que queira viver o outono dos seus dias a definhar nesses pensamentos. Leio-o nos seus olhos. Olhos de um amor angustiado, de quem gostaria de proteger e dar mais, mas sabe que não pode. Como eu sei, e lhe agradeço. Agradeço-lhe, come se todos os dias me ofereçe-se o mundo. Basta-me que me olhe. Não lhe posso dizer, "não se preocupe", já lho disse tantas vezes e sei que não vale a pena. Deve ser assim, suponho eu. Tento compreender a sua razão. Talvez se um dia, se me for dada a graça de estar no seu lugar, eu o entenda por fim. Acho que o seu problema é amar demais. Já viu bem, afinal nem tem razões para estar nesse constante desespero. Como eu gostava que aproveitasse melhor a vida sem estar sempre á espera que algo nos aconteça. Eu sei, por diversas vezes, já tive que lhe dar razão e reconheço que se não fosse tão previdente, os tropeções seriam quedas difíceis de resolver. Também eu ando angustiado, comecei a perceber que nada, e infelizmente, ninguém é eterno, e a percepção de finitude, de coisas (lato senso) e pessoas é uma realidade à qual não podemos fugir. Percebo-o agora à medida que os anos passam, e que também eu, já olho para o retrovisor e vejo alguma estrada andada. 

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Haja pundonor!!

Está um gajo todo compungido e circunspecto, na fila para comprar a sua nova viatura automóvel, quando olha em frente e dá com outro adquirente nestes propósitos. Eu sei que há pessoas a fazerem enormes sacrifícios para pagarem as suas viaturas, mas um pouco de rectidão (recto e dão, não fica bem neste caso, leia-se, dignidade) fica bem a toda a gente.

Muito prazer em conhecer

Via ftp//server, finalmente fui apresentado a um casal, muito bem apessoado e educado, que deambula aqui pela empresa pr'aí há um mês. Diz qu'é acauntes.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Alguém...

...ligue a este pobre apaixonado, e lhe diga, que se a História é cíclica, e se repete, isto pode não acabar bem.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O banco de horas

E pronto, a pedido de várias famílias, cá vai

Chamava-se, chama-se, averotejo.blogspot.com, foi o blog que serviu de depósito a tudo aquilo que me apeteceu pôr lá dentro. E foi muita coisa. Ajudou-me a expiar alguns demónios interiores que fazem parte da vida de qualquer pessoa. Começou a 15 de Março de 2008 e parou a 11 de Fevereiro de 2009. Não tem grande pretensão este que agora começa, daí o nome. Serão apenas uns rabiscos de ideias sobre o que me apetecer aqui depositar. 
Porque demasiado negro e pessoal, aquele continuará a ser o meu quase-diário (nem tão diário assim) privado, ao qual ninguém acederá e ao qual também não quero voltar. Reli o que lá está de Fevereiro a Setembro e quase não me reconheço. Mas essa fase existiu, foi vivida e ficou registada. E já passou. Algumas coisas que lá estão, talvez voltem a estar aqui, porque as gostaria de partilhar e pode ser que façam sentido a quem as ler. Ou talvez não. Não importa. Não escrevo para ser lido, visto ou ouvido e sei que essa possibilidade vai condicionar, como não acontecia anteriormente, o que aqui vai ser despejado.
Tentarei abstrair-me disso para que a terapia continue a resultar.